Este texto
abaixo foi escrito por Carlos
Drummond de Andrade no livro Antologia
poética.
Aos novos
leitores
Nasci em
Itabira, Minas Gerais, em 1902, e o meio físico e social de minha terra
marcou-me profundamente. Pertenço à classe média brasileira. Ganhei a vida como
funcionário público e jornalista. Dediquei-me à literatura por prazer. Hoje que
estou aposentado naquelas duas atividades, posso considerar-me escritor
profissional, pois a fonte principal do meu sustento resulta do fato de escrever e publicar
livros, que o público tem recebido com simpatia.
Meus livros
são de prosa e de poesia. Na primeira categoria, os textos compreendem contos,
crônicas e algumas tentativas de crítica literária. Ligue-me na mocidade ao
movimento modernista brasileiro, que se afirmou em São Paulo, em 1922, e que
deu maior liberdade à criação poética. Liberdade que não é absoluta, pois a
poesia pode prescindir da matéria regular e do apoio da rima, porém não pode
fugir ao ritmo, essencial à sua natureza. Há muitas experiências de vanguarda,
procurando abolir tudo que caracteriza a arte da poesia, mas ninguém até hoje
conseguiu acabar com a melodia e a emoção do verso autêntico.
Fui muito
criticado e ridicularizado quando jovem. O meu poema “No meio do caminho” , composto de dez
versos, repete de propósito sete vezes
as palavras “meio” e “caminho” . Isto foi julgado escandaloso; hoje o poema
esta traduzido em 17 línguas, e me diverti publicando em livro de 194 páginas
contendo as descomposturas mais
indignadas contra ele, e também os elogios mais entusiásmaticos. Achavam-me
idiota ou palhaço; suportei os ataques porque ao mesmo tempo que recebia o
estímulo de meus companheiros de geração e de pessoas mais velhas, nas quais
depositava confiança, pela capacidade intelectual e pela honestidade de
julgamento que as distinguiam.
Atualmente,
a maioria das opiniões é favorável à minha poesia, e direi até que há talvez
excesso de benevolência com relação a ela. Não tenho pretensão de ser mestre em
coisa alguma, e conheço minhas limitações. Depois de praticar a literatura
durante mais de 60 anos, publicando 16 livros de prosa e 25 de poesia, não
cultivo ilusões, mas continuo acreditando com o mesmo fervor na beleza da
palavra e no texto elaborado com arte.
Acho que a
literatura, tal como as artes plásticas e a música, é uma das grandes
consolações da vida, e um dos modos de elevação do ser humano sobre a
precariedade da sua condição.
Carlos
Drummond de Andrade
Postado por Murilo Henrique Donini
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